sábado, 20 de dezembro de 2014

Planalto de Esgoto Central (PEC) 215

Creio que todos os que acompanharam e participaram do processo que mobilizou a comunidade brasileira nas últimas semanas, ficaram surpresos com o resultado positivo. A maioria com certeza dirá que é cedo para comemorações, mas da forma como o governo PT vem conduzindo a questão indígena nos últimos anos, para mim foi mais do que um suspiro de alívio. Foi um grito de vitória!



Brasília foi invadida mais uma vez por indígenas, inclusive integrantes do Movimendo de Rexistência da Aldeia Maracanã, que estiveram presente como sempre. Foi bonito de se ver, o povo se manifestou com bravura, contra políticos tão ratazanas que tentaram até sorrateiramente votar a PEC quarta-feira na calada da noite! Como criancinhas mimadinhas. 



Todo o protesto é claro se resumia a conflito de terras. A PEC basicamente transferia do Executivo (no caso a FUNAI), para o Legislativo, a responsabilidade de demarcar terras. Processo que supostamente já havia sido interrompido no governo Dilma.  Caso o Legislativo passasse a controlar a demarcação de terras indígenas, todas as lideranças indígenas passariam a significar nada. Todos os agentes indígenas que fazem a ponte entre as aldeias e a o governo desapareceriam. As reservas indígenas passariam a ter o mesmo status de uma área de preservação ecológica. Na prática teriam o mesmo respeito que um latifundiário tem por um aterro sanitário.

Nesse contexto se juntou a voz do povo contra a nomeação também da Katia Abreu para o Ministério da Agricultura. Katia Abreu é Presidente do CNA, Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, órgão que está sobre investigação do MPF no estado do Mato Grosso. A tendência é de que esta senadora piore ainda mais a situação da demarcação de terras, que já se utilizam de uma má interpretação da constituição.

O fato é de que o discurso do governo tende a ser, segundo as próprias palavras da senadora de que: "Se em 88 tinha índio [na área], [a área] é de índio e não vamos discutir. Mas se em 88 não tinha índio [na área], [a área] é de não índio". O que ela quer dizer com isso é que, se no momento da escritura da Constituição de 88 habitavam índios em uma determinada área ou não, é o fator determinante de se aquela é área indígena ou não. O que é um verdadeiro absurdo por três motivos, o primeiro é óbvio, de que sabemos que logo antes desta data muitos e muitos índios foram expulsos de suas terras justamente com o objetivo de se aproveitar dessa “Lei”, que eles já sabiam que iria vir. Segundo é de que diversos estudos das melhores universidades dos país estão aí pra comprovar que a ancestralidade de diversas áreas são muito maiores, históricas, e tradicionais do que é concedido aos povos do Brasil hoje. E terceiro que, porque índios não tem o direito de adquirir mais terras ao longo do tempo, já que sabemos que a maioria das reservas são ínfimos pedaços de terra? E porque povos indígenas não tem o direito de procriar e crescer com os anos? Gerando assim uma necessidade de áreas maiores para se viver.




Por enquanto vencemos uma batalha. Mas vamos nos preparar para 2015, quando os ruralistas virão certamente armados com mais parlamentares e mais um novo relatório e uma nova Comissão Especial, e o que é pior, com novas propostas maquiavélicas. Não existem terras à venda!

quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

A Globalização Desculturaliza o Mundo

Foi assim que falou um dos entrevistados de “Por Que Quebró McDonald's em Bolivia?”, um documentário que explica como este país chegou a ser o único na América Latina a não possuir um restaurante desta cadeia de fast-food. O motivo principal defendido pelo filme é que o estilo de vida dos bolivianos é voltado para um ritmo mais lento e harmonioso, portanto a forma de cozinhar deste povo não combina com “comida rápida”, e prazeres instantâneos. Segundo este documentário o Brasil tem 480 restaurantes McDonald's, e sei lá quantos Bob's (como se o Ronald não fosse suficiente), e os resultados já podem ser vistos nos corpos do nosso país, tão acostumados com os esbeltos contornos dos povos originários.

Outro exemplo de desculturalização é a invasão de pastores evangélicos nas aldeias, que chegam a ficar décadas tentando traduzir a Bíblia para a língua nativa, gerando uma separação das gerações mais jovens com as tradições milenares. As nossas tradições brasileiras já são repletas de mistérios e de difícil acesso até para os próprios indígenas, uma pessoa tem que passar por várias "baterias" de ritos de passagem, para ter a honra de ser aprendiz de pajé. Instituições Católicas e Protestantes chegam, mascarados de benefícios sociais e de saúde, com a ideia de que “vocês só tiveram remédios e comida depois de aceitarem Jesus”, reeditando o roteiro já manjado dos Jesuítas, já que é impossível ter memória de algo que não está escrito na História. Mas por outro lado já é hora do povo acordar, já vivemos em um mundo com livre acesso à internet, a filmes como “O Segredo - A Lei da Atração” e técnicas como o PNL.



Espero que os indígenas utilizem a Bíblia não só no nível superficial, religioso, e até negativo. Gerando culpas de ser o que são. Tendo preconceito da sua própria cultura. Essa manipulação mental é horrível, nojenta, e “jogo sujo” dos Globalistas. Tomara que os parentes comecem (rápido!) a se ligarem no conteúdo mais profundo e esotérico da Palavra, que só pode ser compreendido após a análise de uma Bíblia Transliterada. Esse estudo sim, pode vir a acrescentar ao invés de diminuir, pode vir a ser uma informação de sabedoria universal, que ajudará a compreender a nossa própria mitologia. Está na hora de começarmos a ver com outros olhos nossos próprios mitos, e a renovarmos o interesse do povo em suas crenças, que também são cheias de profundos conhecimentos.


Muitos indígenas sofrem até com o reconhecimento do nome. Vergonhosamente tivemos que esperar até o dia 1º de Abril de 2014 para que se pudessem incluir nomes indígenas nas identidades. Até os deputados nos darem a graça da permissão de usarmos nossos próprios nomes, nós índios éramos obrigados a ter dois nomes, como José, Pedro, etc apenas para colocar na carteira, e um oficial dado pelo pajé para a convivência normal na Tekohaw, como Rudá, Potira, etc. Mas mesmo assim, isso é só uma “meia correção”, de um direito que foi retirado de todas as etnias Tupi-Guarani de forma fascista, com o intuito de facilitar a manipulação mental do povo. Ainda assim eles não são bobos, digo correção pela metade porque apenas dois estados autorizam a inclusão do Povo/Etnia no RG, sendo que este seria o equivalente ao “sobrenome” do índio, mas que tem uma relevância muito mais séria, é claro.

Esse ataque descarado continuou até o Facebook. Usuários que se identificaram com a causa Guarani-Kaiowá foram obrigados a retirar o nome da etnia do "sobrenome" de seu perfil. Aquilo foi uma forma de tentar coibir estas manifestações pacíficas contra o despejo dos indígenas da fazenda Cambará, na cidade de Iguatemi, no Mato Grosso do Sul. Indíos Norte-Americanos também foram bloqueados desta rede social por usar seus nomes originais. Alguns índios tiveram seus nomes mudados inclusive automaticamente, e só tiveram permissão de usar o nome real após ameaçarem entrar na justiça:
"Eles não tiveram nenhum problema em mudar meu nome para o de um homem branco, mas perseguiram a mim e outros, forçando-nos a provar nossa identidade enquanto outras pessoas mantinham os nomes delas. Nosso povo precisa saber que eles podem lutar de volta. Se mais pessoas reclamarem, eles vão mudar”, disse Brown Eyes.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Chegou a hora de nós dizermos: Vocês não são Civilizados!


A mesma ladainha que nós brasileiros escutamos a vida inteira: “vocês são selvagens, vivem na selva como animais!” precisa finalmente ser repetida para os europeus. Ou aqueles que aqui vivem e se identificam com o capitalismo e a maneira de viver dos colonizadores.

Os próprios latifundiários brasileiros estão se comportando de forma idêntica aos europeus 500 atrás.  Praticam genocídio, agridem física e psicologicamente povos originários neste exato momento sem nenhuma represália da Justiça.  Pyelito Kue é uma aldeia que tem fornecimento de eletricidade limitado, e depende desta para operar um poço artesanal que é o seu único acesso à água. Meses atrás então, um fazendeiro local derrubou o poste de energia que abastecia a comunidade, assim, iniciando um período de verdadeiro terrorismo contra os indígenas.

O próximo passo foi, por “coincidência”, deixar a tekoha sem comida.  Logo em sequencia os alimentos que estas 50 famílias recebiam pararam de ser repassados para a comunidade pela Funai e a Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena). Os parentes lá estão sobrevivendo à base de estender paninhos na umidade e chupar, e farinha. Nada mais.

Capangas da fazenda Cachoeira estão literalmente fazendo um cerco ao redor da reserva. Motoqueiros dos fazendeiros bloqueiam as estradas de acesso, enquanto pistoleiros disparam literalmente contra os Kaiowá.  Lideres estão sendo ameaçados a todo momento e inclusive um barraco foi incendiado (isso sem falar dos Kaiowá que estão presos ou já foram assassinados ao longo dos anos). Em Pyelito uma menina morreu de desnutrição e um jovem gravemente ferido por uma bala de borracha.

Tudo isso deixa claro que o caso dos Guarani-Kaiowá (Paí tavyterã) é um exemplo para todos os Brasileiros. É uma referência de extremo descaso, o ponto em que chegou a indiferença com tudo aquilo que é tradicional deste país.   A terra para os Kaiowá, bem como para a maioria dos povos indígenas, é sagrada. Eles tem uma relação afetiva com a Tekoha (Lugar de Vivência). Em geral os povos originários não conseguem conceber a posse de um pedaço de terra, muito menos sua monetização. Mas infelizmente nos dias de hoje fica difícil enxergar outra saída, senão a demarcação.

Há pouco mais de uma semana Marinalva, uma ativista indígena, foi assassinada após voltar de Brasília.  Ela voltava de uma manifestação em defesa da terra Nu Verá, e era integrante do conselho Aty Guassu. Ela foi encontrada com marcas de facada na BR-163, próximo a Dourados.  Em 2013 foram 39 homicídios entre os Kaiowá, um dos motivos é a não demarcação das terras.  A desculpa dada pelo governo é de que justamente em 1988, o “ano da Constituição”, eles haviam sido expulsos dali alguns anos antes. Isso mesmo com estudos antropológicos que confirmam que ali é território tradicional desta etnia. Para piorar a situação existem poucos empregos em Dourados.

O estado do Mato Grosso do Sul, possui pouco mais de 35 milhões de hectares, comparavelmente é do tamanho da Alemanha, a 3ª maior economia do planeta. Deste território, 66% (22 milhões de hectares) é ocupado por gado, 6% é ocupado por soja (2,1 milhões de hectares), 700 mil hectares são ocupados por eucalipto (provavelmente tentativas de reflorestamento que causam danos extremos ao solo).  Apenas 8 milhões de hectares são ocupados pelos 28 municípios que constituem os  Guarani Kaiowá, região em que habitam há séculos.  Além destas terras, o 2ª maior povo indígena do Brasil reivindica outras terras em Dourados, Iguatemi e Caarapó, que juntos somam 900 mil hectares.


quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Porque não ceder Áreas de Proteção Ambiental para povos indígenas?

Recentemente um estudo comprovou que reservas de povos nativos do mundo inteiro são as que mais preservaram suas florestas. A taxa de desmatamento foi de quase zero, sendo que ao redor os níveis chegam a ser estratosféricos em alguns países, como na Guatemala e no México. Como podemos ver nesta foto de satélite abaixo, da região da Bacia Amazônica, pode-se ver claramente que as reservas indígenas são como "ilhas de floresta", com "mares de desmatamento" por todos os lados!


Este mesmo estudo da WRI e a RRI (Rights and Resources Initiative) chegou à conclusão que apenas as Aldeias com pleno poder administrativo sobre suas terras conseguiram ter estes resultados. Então será que se a Reserva, entre a Barra da Tijuca e o Recreio, fossem ocupadas por povos indígenas, quem sabe não teriam se livrado de se tornar um Golfe Olímpico (e futuramente condomínio e resort)? Como o próprio estudo conclui, reservas ecológicas e terras indígenas sem gestão própria não obtém o mesmo resultado.


Desde 2004 o Brasil vem reduzindo sua taxa de desmatamento em 70% por ano graças as ações do SIPAM. Sua monitoração e mapeamento são feitas por aviões, drones e satélites Japoneses equipados com radares de última geração, que supervisionam a Amazônia até à noite. Em 2009, durante a Conferência de Copenhague, o Brasil se comprometeu a reduzir seu desmatamento em 65% até 2020. Esta empreitada foi batizada com o nome de Projeto Arcoverde.

Aqui no Estado do Rio de Janeiro temos quase 20% da nossa Mata Atlântica preservada. Lugares como a Reserva Biológica União e o Parque Nacional Serra dos Órgãos parecem estar fora de perigo. Mas o RJ já foi campeão brasileiro de destruição entre 1990-1995, hoje em dia parece ser um dos que menos desmata. Segundo a Fundação SOS Mata Atlântica nosso estado desmatou apenas 11 hectares entre 2012-2013 e 40 ha entre 2011-212, enquanto Piauí, Minas Gerais, Paraná e Bahia juntos desmataram 21.973 hectares, o equivalente a 92% de tudo que se desmatou nos 17 estados que abrigam a Mata Atlântica. Embora aparentemente nosso estado esteja de parabéns, vale à pena lembrar da "Vingança da Mãe Natureza" ocorrida em 2008, quando gaviões, jacarés e preguiças invadiram casas de moradores do subúrbio e Niterói, fugindo de queimadas ilegais.

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Introdução ao Blog/Vlog




Ola, Katu ahy para todos,

Como vocês podem ver, já tem 3 anos que eu não posto nada neste Blog, então gostaria de falar um pouco sobre o novo rumo que esta página, Todos Soms Um, vai tomar. Primeiramente eu gostaria de me apresentar, meu nome é Geoffrey, tenho 35 anos, sou brasileiro/americano, e tenho cidadania européia também. Mas eu estarei utilizando esse Blog para resgatar a minha identidade indígena. A minha ancestralidade comprovada é da tribo Ojibway (Chippewa), da etnia Anishnabe, que vivem tradicionalmente nas terras ao redor dos Grandes Lagos, onde ficam as Cataratas do Niágara. Por isso escolhi essa gravura que é um Thunderbird (Wakį́yą) que nesta tribo é usada como um totem, desenhado em artesanatos e também faz parte da Mitologia e Cosmologia deste povo. Essa também é a tribo que originalmente utilizou o Filtro dos Sonhos, muito popular hoje em dia.


Evidentemente, por estarmos no Brasil, vou estar falando na maioria das vezes de indianismo brasileiro, até porque a tendência é que todos nós brasileiros tenhamos algum sangue tupi no nosso DNA. A princípio eu vou focar bastante nos índios Guarany Mbya e nos Guajajaras. Os Mbya é claro pela proximidade, vou tentar inclusive visitar algumas aldeias, aqui no RJ e SP. E os Guajajara pela importância histórica, e a quantidade extensa de material que está disponível. Atualmente estou estudando o Zeegete do tronco Tupi, e Tupi Antigo que foi nosso idioma no Brasil por 150 anos. Existem vários grupos de estudo no Facebook e na internet em geral desta língua, que é bem válida todo brasileiro dar uma olhada, já que gastamos tanto tempo estudando inglês, porque não dedicar um pouco e tempo a algo verdadeiramente nosso?


É claro que vamos estar aqui denunciando injustiças sempre, com um foco especial para a Aldeia Maracanã, os Gurani-Kaiowa e Belo Monte.


A melhor forma dessas situações bizarras de desrespeito com os indígenas pararem de acontecer, é resgatando a nosso cultura, que é a melhor forma de prevenir contra os assassinatos, roubo de terras, preconceito, desmatamento e conversão religiosa. Isso tudo é uma faca nas costas do próprio povo brasileiro, e a única forma do resto do mundo nos respeitar é nós respeitarmos a nós mesmos.


Vamos falar também do conhecimento ancestral, da cosmologia, da convivência dentro da Aldeia, os ritos de passagem, a relação entre homens e mulheres. Como eles se vêem em relação ao mundo, o etnocentrismo, porque eles se referem como “parentes”, porque o “sobrenome” deles, é o próprio nome da tribo. Qual a relação do índio com a Natureza, e a espiritualidade, pajelança, etc.


Como estudante de mestrado, de Cultura e Língua Indígena, com certeza estarei usando este Blog também como intercâmbio de idéias. Com certeza minha bibliografia ainda está deixando bastante a desejar, então vou pedir que os visitantes deixem sugestões de livros, filmes, páginas etc para me ajudar! Principalmente sobre mitos.


Vou estar dando bastante feedback nas minhas aulas na UERJ com o professor Urutau Guajajara. Obrigado Anam! Zawri e até a próxima!!!